sábado, 2 de outubro de 2010

Cuidado Ator . . .

"Um corpo - em - vida é um corpo em constante comunicação com os recantos mais escondidos, secretos, belos, demoníacos e líricos de nossa alma. É o receptáculo da poesia do teatro. O ator é um 'atleta afetivo', como diz Artaud" (FERRACINI, 2003).

Na concepção de Artaud, o corpo comporta todos os símbolos de uma geografia cósmica: montanhas, céus e mares estão todos aqui na nossa carne. Isso lembra a relação holística do "Tao da Física" de Frijtof Capfra de que nosso corpo é o espelho do universo, e a esse todo devemos nos integrar para transformar. Ao transformar somos transformados, dizia Marx. Harold Bloom também menciona que em nosso corpo estão céus, infernos, anjos, deuses e demônios. Hércules descobre, realizando seus 12 trabalhos, que o que nos torna divinos e humanos é a capacidade de saber que somos deuses, o DEUS está em nós. Pierre Fatumbi Verger ao falar da magia yorubana, destaca o poder da palavra em todas as formas de feitiço. Mas não a palavra cotidiana, antes ritualizada, ressignificada, que é capaz de transformar o curso de uma realidade. Em Artaud, a palavra cria e recria novas realidades. O simbólico se torna concreto e vice-versa. Somos produto de nossas palavras. Isso lembra também Jung em "O Segredo da Flor de Ouro", quando fala dos egrégoras, filhos que geramos com nossos desejos, pensamentos, palavras e ações. Shiva em sua dança transforma o universo.

Atenção ator: muito cuidado ao abrir a boca e evocar o gesto , você lida com símbolos, anjos, deuses, demônios, graais. Você é o mago, o profeta de um novo tempo. Criemos uma nova realidade com nossas palavras, nossos corpos e ações, busquemos o equilíbio e a comunhão dos seres humanos para viver aí a capacidade inata de sermos deuses.

É este Teatro que me proponho: teatro e magia, tetro e bruxaria, arte, ciência e religião. Saravá Dioniso!

William Berger

09 -09-2008 às 00:41 hs.

BIBLIOGRAFIA:
FERRACINI, Renato. A Arte de Não Interpretar como Poesia Corpórea do Ator. Campinas.: Editora da Unicamp, 2003. 300 p.

domingo, 21 de fevereiro de 2010

Quixotesco

Ainda criança
sonhava como hoje
um sonho real
em minhas brincadeiras.

E cantava às multidões
imaginadas a música
que só eu sabia.
Vivia o personagem
sem engrenagens
ou carpintaria.

Via fantasmas
Seres da mata.
No fim do arco-íris
buscava o pote
de ouro e prata.

Travava guerras com arbustos
Abria heroicamente gaiolas
E das arapucas
soltava as piaçocas.

Continuo o mesmo
e assim serei.

Porém, hoje, os arbustos
são frondosas árvores
e meus fantasmas
não assustam como outrora.

Os passarinhos fugiram do brejo
e o coachar do sapo prenuncia o fim.

O que será se mim
neste vasto mundo?
Se não me chamo Raimundo
ou Segismundo?

Exposto a tudo
neste grande teatro,
encerro o ato.
E no camarim pergunto a mim:
Esta vida é sonho?
Tudo vale à pena?
Somos feitos da mesma matéria dos sonhos?
Tragédia ou Comédia?
Reescrevo o verso
Reinvento o fim.
Mudo completamente o enredo
e digo sem medo:
SOU DEUS!!!

18/01/2009